Mario Goelzer e
Otilia da Rocha Morsch
Mario Goelzer e
Otilia da Rocha Morsch
Mario Goelzer nasceu em 22/01/1901 na Estância Butiá, distrito de Coxilha, município de Passo Fundo.
Certidão de nascimento que solicitei em agosto 2021. Cópia do lançamento no livro de nascimentos do Cartório, mostrando que Vô Fernando fez a declaração no dia 27/01/1901.
Em 10/03/1925 Mario casou com Otilia Morsch, filha de Lucinda e Ernesto Morsch. A cerimônia foi na residência de Ernesto Morsch.
Otilia nasceu em 10/10/1905 em Passo Fundo, RS. No Registro do livro de nascimentos o nome é Othylia. Em documentos posteriores foi usado Ottilia. Na certidão de casamento consta Otilia. Então utilizamos Otilia nestas notas.
Otilia e Mario tiveram os seguintes filhos:
Maria de Lourdes que nasceu em 10/03/1926, casou com Luis Antônio Meira e faleceu em 22/04/2016.
Luiz Carlos que nasceu em 16/01/1930 e casou com Carmen Figuera. Luiz tambem casou com Enede Catarina Casaroto. Faleceu em 21/11/2016.
Lidia nasceu em 26/02/1933, casou com Geraldo Pansera e faleceu em 15/07/2018.
Ligia que nasceu em 09/09/1936, casou com Gennaro Alfano e faleceu em 29/11/1994.
Lucio Valerio (autor destas recordações) nasceu em 24/07/1938 e casou com Berenice Isabel Ferrari.
Ernesto Fernando nasceu em 11/02/1941 e casou com Vera Regina Timm. O nome Ernesto Fernando é em homenagem aos avós Ernesto Morsch e Fernando Goelzer. Faleceu em 06/04/1986.
Lucidio que nasceu em 07/06/1943 e casou com Sonia Sittoni.
Em 2021, quando escrevo este texto, os sobreviventes são o caçula Lucidio e eu. Lucidio com esposa Sonia e filhos comandam a Quinta da Estância e mais recentemente a Estância das Oliveiras com seus azeites premiados.
O casal Otilia e Mario residiu inicialmente em São Sebastião (RS) antes de se estabelecer em Coxilha. Quando já morando em Coxilha meu pai era frequentemente chamado para coordenar a festa anual da igreja de São Sebastião.
O Triticultor
O interesse na triticultura começou no fim dos anos 30. Ele acompanhava as iniciativas de suporte por parte do governo como, por exemplo, a criação da "Estação Experimental de Trigo de Passo Fundo" localizada na vila Engenheiro Luiz Englert. A área utilizada para os experimentos tinha características similares às utilizadas pelos colonos daquela região, isto é aqueles que plantavam trigo em áreas desmatadas.
O pai acompanhava com muito interesse o trabalho de Ivar Beckman, geneticista e agrônomo sueco, chamado de “o pai do trigo”, que chegou ao Brasil em 1923 e se tornou responsável pela criação de muitas variedades de trigo cultivadas no Rio Grande do Sul. Para mais detalhes ver "O Rei do Trigo" .
Com o tempo o pai foi se convencendo que a plantação do trigo em roças não tinha possibilidade de ser competitiva com o trigo estrangeiro que era produzido em grandes áreas e com mecanização. Na Segunda Guerra Mundial o preço do trigo tinha aumentado muito e continuou alto durante vários anos depois da guerra, e isto tornava o trigo brasileiro ainda menos competitivo.
Num determinado momento, ele começou a ficar com uma obsessão - o acompanhamento contínuo do custo total para o Brasil, resultante da importação de trigo principalmente da Argentina.
Ele consultava o Correio do Povo, fazia uns cálculos e me dizia: “sabe quanto o Brasil está gastando por dia na importação de trigo” ? E citava o valor. Outro dia, com novos dados, dizia: “sabe quanto o Brasil gasta por hora com a importação de trigo” ? E citava o valor que ele tinha calculado.
Ele criou um slogan “Plantai trigo pela redenção do Brasil” e divulgou a ideia com os meios limitados da época.
Gradativamente se convenceu que o modelo corrente tinha que ser modificado. Ele poderia demonstrar que era possível uma triticultura mecanizada nas coxilhas do Planalto.
Não foi fácil começar pois é necessário planejar e investir. Precisa gente, precisa máquinas, precisa sementes, precisa determinação de curvas de nível para a aragem e plantio, precisa analisar a composição da terra, precisa produtos para corrigir a terra, precisa de fertilizantes para ajudar a terra, precisa escolher a data mais apropriada para o plantio, precisa do aconselhamento de agrônomos, etc. No começo foi sem máquinas, arado tradicional e colheita com foice.
Enfrentou o desafio e começou o plantio. Ver o vento balançando um trigal na encosta de uma coxilha é muito bonito. Foi um pioneiro.
A edição especial de aniversário do Diário da Manhã de Passo Fundo de 23 de Novembro de 1974 inclui um artigo interessante sobre o pai. Partes do texto sguem abaixo:
SURGIU UM PIONEIRO NO BUTIÁ, EM PASSO FUNDO
Em 1948, o vereador pessedista, Mario Goelzer e industrial na Vila Coxilha, sede de um distrito de Passo Fundo, contrariando todas as opiniões, principalmente de seus familiares, resolveu lavrar vários alqueires de barba de bode de seu campo no lugar denominado Butiá, para fazer a primeira lavoura de trigo do Brasil, em terras de campo. Os amigos de Mario Goelzer passaram a se preocupar com a sua saúde mental, achando que o conhecido cidadão de Coxilha estava sofrendo dificuldades mentais.
Mario Goelzer faz o preparo da terra e lança nela a semente de trigo que consegue obter. Os técnicos da Secretaria da Agricultura, quando alguém passava na plantação de trigo do sr. Mario Goelzer, esboçavam um sorriso que bem denunciava suas incredulidades.
O prefeito da época, Sr. Armando Araújo Annes, amigo pessoal do improvisado triticultor, procurou dissuadi-lo da empreitada, achando mesmo que a semente deitada à terra nem chegaria a germinar.
Quando o trigal começou a deitar cachos, Mario Goelzer enviou um entusiasta telegrama ao Presidente Gaspar Dutra, que de imediato, contestando-o, congratulou-se com o arrojado triticultor, pela oportuna iniciativa que tinha por finalidade a redenção econômica do Brasil.
TRIGAL E CHURRASCO
Empolgado pelo sucesso trigo em da cultura do terras de campo, Mario Goelzer convocou os amigos e as autoridades civis e militares do Município para uma visita à sua Granja do Butiá, no Distrito de Coxilha. No meio do trigal, Mario Goelzer ergueu uma tenda para receber os visitantes.
Lá compareceu, naquele dia ensolarado de 7 de novembro de 1948, o então prefeito Armando Araújo Annes, o incrédulo, que de mão estendida, ao contemplar o majestoso trigal, confessou-se em condições de receber o castigo pela sua descrença em tal cultura; lá esteve o comandante da unidade da força federal, o hoje General Mario Fonseca; o vereador Pedro dos Santos Pacheco, líder da bancada pessedista na Câmara de Vereadores, que certa vez aconselhara, muito paternalmente, seu liderado e amigo a abandonar a aventura de plantar trigo em terras onde somente vicejava barba de bode; lá compareceram vários amigos do triticultor-pioneiro, inclusive o diretor do DIÁRIO DA MANHÃ, que na edição de 9 de novembro daquele ano, publicava longa reportagem dando ciência detalhada a respeito da reunião, do churrasco e do rico trigal.
PELA VERDADE HISTÓRICA
Por várias vezes tem surgido, em Carazinho, pronunciamentos injustos e inverídicos quanto à verdade histórica, reivindicando-se, não se sabe para quem, o privilégio de ser o pioneiro da cultura do trigo no campo.
Ainda agora, por ocasião da visita do presidente Geisel, o Prefeito Sr. Ernesto Keller, em discurso cujo resumo foi divulgado por vários jornais, reivindicou para Carazinho a primazia da cultura do trigo em terras de campo. Por certo, o digno e operoso administrador da vizinha comuna amiga esqueceu que o jornal "O Noticioso", tradicional órgão da imprensa de sua cidade, em sua edição de 4 de agosto de 1953, de número 1.177, publicou em sua primeira página, sob o título de Honra ao Mérito", um longo comentário, no qual, a certa altura, escreveu o seguinte:
"1) Começamos por Passo Funda, que foi o iniciador da plantação de trigo no campo, já que foi o cidadão Mario Goelzer, Coxilha, que fez a primeira plantação de trigo em campo aberto"
É o jornal "O Noticioso", órgão da imprensa carazinhense, que faz tão inequívoca afirmação, colocando assim por terra, toda e qualquer pretensa reivindicação menos lisa.
0 sr. Mario Goelzer foi o primeiro a plantar trigo em terras de campo. Esta verdade desafia qualquer contestação, porque é verdade provada com documentos e não com palavras.
Para comprovar o que estamos afirmando, estamos divulgando, com esta reportagem, algumas fotografias tiradas por ocasião da visita feita por diversas autoridades e convidados especiais à fazenda do Sr. Mario Goelzer, no Butiá. Nas fotografias, aparecem as pessoas, o trigal, o local da lavoura e a data em que foram as mesmas batidas.
Nas coleções do DIÁRIO DA MANHÃ, quem quiser se certificar do que estamos afirmando, desde já colocamos diversas reportagens publicadas na época à disposição dos que pretenderem o restabelecimento da verdade histórica. 0 sr. Mario Goelzer, por ter sido o primeiro a plantar trigo no campo, não se considera gênio, não se sente orgulhoso por seu feito e não reivindica reconhecimentos ou títulos honoríficos. Cidadão simples, sem vaidades e sem vocação para a vida nas alturas da glória, Mario Goelzer costuma dizer que sempre se sentiu feliz e realizado por ter contribuído, ainda que modestamente, para o desenvolvimento da triticultura nacional, através da qual o Brasil apressa a sua emancipação econômica.
Justa homenagem da comunidade passofundense ao pioneiro da plantação do trigo em campo aberto.
HOMENAGEM JUSTA
Por ocasião de uma Exposição Agropastoril de Passo Fundo, foi prestada a Mario Goelzer, em nome da comunidade passofundense, uma justa e merecida homenagem que lá se encontra, para todo o sempre, naquela placa de bronze grudada na pilastra e que é vista em frente ao pavilhão principal da EFRICA.
Naquela placa está a verdade. O resto vai com o resto …" FIM DO ARTIGO DO DIÁRIO DA MANHÃ
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Uma foto de Mario Goelzer com Tulio Fontoura no aniversário do Diário da Manhã:
Um dito importante, expresso de maneira diferente por diferentes líderes mundiais diz que "uma cidade que não preserva e valoriza seu passado não é digna de um futuro".
O monumento em homenagem a Mario Goelzer foi removido e a placa se encontra na Embrapa. É obrigação da Prefeitura de Passo Fundo expor a placa num lugar mais significativo. O monumento foi inaugurada em presença do Prefeito Mario Menegaz. Existe uma foto, vou tentar localizar. Quem tiver a foto favor enviar cópia a lucio@goelzer.net. Um artigo do Jornal do Brasil de 06/01/1974, talvez exagerando um pouco, fala sobre o pioneiro e na introdução diz "Mario Goelzer, hoje com 70 anos, tem praça e busto em Passo Fundo".
O agrônomo Carmine Rosito, outro especialista no desenvolvimento de variedades de trigo e mais tarde de soja, também aconselhou o pai. Ele visitou o trigal no Butiá.
Existem muitos textos que mencionam o pioneirismo de Mario Goelzer no plantio de trigo no campo. Selecionei o que o engenheiro agrônomo, agricultor e passo-fundense Luiz Graeff Teixeira disse numa entrevista para o jornalista Luiz Carlos Schneider do “O Nacional”.
“Produtividade e preservação do solo com o plantio direto” Por Luiz Carlos Schneider - O Nacional, 07/08/2020
“Nas décadas de 50/60, a agricultura em Passo Fundo era incipiente, os campos com barba de bode mostravam solos muito pobres, ácidos, baixa fertilidade, como consequência baixas produtividades, dificultando o sucesso do agricultor. Os plantios de cereais eram realizados em terras de mato. Derrubava-se o mato para fazer a roça, usava-se pouco adubo, quando enfraquecia a terra, novo desmatamento, e assim foram diminuindo nossas matas nativas. Neste tempo se cultivavam as culturas de subsistência: arroz, milho, trigo, feijão etc., em pequenas áreas, até que pelo pioneirismo, coragem e competência do Sr. Mario Goelzer, na sua fazenda no Butiá, município de Passo Fundo, plantou uma grande área de trigo, nos campos de barba de bode.”
Foi a primeira lavoura de trigo mecanizada voltada para a batalha da produção de trigo em alta escala.
Ele organizou churrascos para muita gente, com brazeiros em longas valas cavadas no chão. Era para mostrar a todos o bonito trigal na coxilha, provando que tal cultura era possível.
Nesta foto, a família está no trigal (com o sol nas costas, os rostos não aparecem).
Quase dez anos depois que Mario Goelzer lançou o “Plantai trigo pela redenção do Brasil”, o presidente Getúlio Vargas, em 1952, criou o 'Plantai Trigo', um projeto que visava à auto-suficiência de trigo no país, dando um grande impulso na mecanização da lavoura. A partir desse momento, os agricultores passaram a importar tratores e máquinas agrícolas em grande quantidade. O Banco do Brasil abriu seus cofres para o plantio do trigo. O Presidente Vargas dizia: "Plantai trigo... é a riqueza da Pátria".
Referência: Um pouco de história e política do trigo, Luiz Ataídes Jacobsen - Assistente Técnico Estadual da EMATER/RS, Passo Fundo, RS.
O Político
Nos anos 40-50 o pai era o político de maior visibilidade em Coxilha. Era membro do Partido Social Democrático (PSD), amigo de líderes estaduais como os governadores Valter Jobim, Ildo Meneghetti e Perachi Barcelos. Os outros dois principais partidos eram o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e a União Democrática Nacional (UDN).
Acompanhei alguns comícios do pai em Coxilha e redondezas.
Na eleição para a presidência em 1950 os candidatos eram Getúlio Vargas (PTB), Cristiano Machado (PSD) e Brigadeiro Eduardo Gomes (UDN). Getúlio Vargas era o favorito.
As tentativas do PSD e UDN em terem um candidato único falharam. Existem excelentes textos na Internet detalhando as diferentes tentativas. Recomendo o texto abaixo.
“O fracasso das "fórmulas" e a candidatura Vargas em 1950” - Sérgio Lamarão - CPDOC | FGV • Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil
Finalmente o PSD escolheu como candidato o desconhecido Cristiano Machado que não conseguiu unir o PSD. Muitos setores do PSD recomendaram o voto em Getúlio Vargas. Muitos políticos do PSD gaúcho (João Neves da Fontoura, Batista Luzardo, Gabriel Obino, Ernesto Dornelles, etc) apoiaram Getúlio Vargas.
A atitude do pai foi apoiar quem o partido escolheu. Era típico dele o respeito às instituições. Se o partido escolheu Cristiano, ele respeita o que foi decidido.
Cristiano Machado escolheu a cidade de Erechim para seu comício no norte do estado. Mario Goelzer, como líder importante do PSD na região, tinha que estar presente. Eu tinha 12 anos e o pai me convidou para ir junto para Erechim (mais tarde voltei a Erechim, com o time do Ginásio Conceição, para um jogo de futebol).
Não lembro dos discursos, reuniões e mais detalhes, mas o que não esqueço foi a chegada do avião. O aeroporto de Erechim era de terra batida. Tinha uma “multidão” esperando o candidato onde o avião ia parar. Quando o avião (DC 3 ?) girou para se posicionar, de modo a permitir que Cristiano Machado descesse de frente para o público, a nuvem de pó criada pelas hélices ainda girando foi a maior que vi na minha vida ! Todo mundo ficou empoeirado.
Getúlio Vargas foi eleito com 48% dos votos válidos, o Brigadeiro Eduardo Campos (que já tinha sido derrotado na eleição de 1945) teve 29% e Cristiano Machado teve pouco mais de 20%.
Mario Goelzer foi vereador na Câmara Municipal de Passo Fundo de 28/11/1947 a 31/12/1951. Foi um dos líderes nos preparativos para a comemoração dos 100 anos da fundação de Passo Fundo.
No final de maio de 1954, a Câmara de Vereadores se mobilizou em prol das comemorações, e jornal “O Nacional” atribui essa ação à sua campanha iniciada desde o começo de 1954: Os poderes municipais já estão interessados pelo assunto, sendo de notar-se a indicação do vereador Mario Goelzer, na última sessão da Câmara Municipal, alvitrando várias medidas para os festejos, às quais damos inteiro apoio, e no sentido de que fosse nomeada uma comissão de vereadores para um entendimento pessoal com o sr. Prefeito, para, em colaboração, dar-se início ao movimento oficial em prol do Centenário.
Foram designados os vereadores Dr. Aquelino Translati, Dr. Mario Hoppe e Mario Goelzer, que é um dos mais entusiastas das comemorações centenárias. (O NACIONAL, 28/05/1954, p.2).
De acordo com O Nacional (29/05/1954, p.4), Mario Goelzer citou diretamente a campanha do jornal, o que levou o poder público a se organizar em virtude do centenário.
No Diário Oficial da União de 25/02/1948 se encontra o seguinte texto:
“Presidente da República recebeu do Dr. Elpídio Fialho, presidente da Câmara de Vereadores da cidade de Passo Fundo, Rio Grande do Sul, o seguinte telegrama:
"Consoante indicação do vereador Mario Goelzer, em sessão de 18 do corrente, esta Câmara congratula-se com V. Excia nas oportunas medidas em favor do incentivo da produção agrícola, em especial, da tritícola. E ao mesmo tempo solicita o valiosíssimo apoio de Vossência no sentido de determinar a aquisição em tempo e da maior quantidade possível, de sementes selecionadas de trigo, a fim de serem distribuídas, nas mesmas condições anteriores, a grande número de colonos passofundenses. O motivo do pedido de brevidade para a compra de tais sementes cinge-se ao fato de já existir escassez das mesmas e de evitar, como no ano anterior, o não recebimento por parte dos inúmeros interessados e produtores, que, como colonos locais, nutrem boa vontade de colaborar com os poderes públicos na patriótica campanha de maior produção. Com os protestos de estima e apreço “.
Em resposta, o Presidente Dutra enviou a seguinte e expressiva mensagem telegráfica:
"Acuso o telegrama em que V. Ex. e , em nome da Câmara Municipal e por proposta do vereador Mario Goelzer, se congratula com o meu governo nas oportunas medidas em favor do incentivo da produção agrícola, em especial, triticultura. As medidas sugeridas foram especialmente recomendadas ao Ministério da Agricultura que vem executando minhas determinações quando incrementa e propaga a necessidade do aproveitamento das nossas possibilidades de produção do trigo. Precisamos mobilizar todos os nossos recursos para produzir o pão que consumimos. Saudações" (a) Eurico G. Dutra.
No dia 1⁰ de abril de 1964, o Governador Ildo Meneghetti, com apoio do Prefeito Municipal Mario Menegaz e da Brigada Militar, mudou a sede de governo para Passo Fundo e ficou três dias no quartel da Brigada Militar. Ildo Meneghetti tinha sido eleito governador pela segunda vez com apoio de vários partidos (PSD, UDN, PL, Partido de Representação Popular (PRP) e o Partido Democrata Cristão (PDC)) que formavam a Ação Democrática Popular (ADP).
O pai, como amigo e correligionário de Ildo Meneghetti, foi visitá-lo. Quem acompanhou o pai foi o genro Gennaro (Gege) Alfano. Gege era um contador de histórias nato, com memória para citar longos trechos de São Tomás de Aquino, letras de óperas, trechos de livros, poemas, etc. Enquanto o pai estava lá dentro conversando com Ildo Meneghetti e outros que lá estavam, Gege ficou esperando do lado de fora, caminhando de um lado para o outro e observando o movimento. Tinha um militar perto da porta que se comunicava com superiores em Porto Alegre. Eu “morri de rir” das histórias hilárias, contadas por Gege, que aconteceram na frente do quartel.
A lembrança de meu cunhado Gege neste momento é apropriada pois recentemente foi mais uma vítima da Covid-19. Ele teve o azar de pegar o vírus no momento em que não tinha vagas na UTI do hospital de Uruguaiana. O advogado Gege era muito conhecido na cidade e tinha sido, durante muitos anos, PROVEDOR da Santa Casa de Caridade de Uruguaiana. Mas na hora da hospitalização a fila é igual para todos. Quando conseguiu UTI já era tarde.
O industrialista
Coxilha era o centro exportador de madeira daquela época. Junto com Bosquirolli, o pai tinha uma serralheria na principal esquina de Coxilha (esquina da rua que passava na frente de nossa casa e frente da estação ferroviária com a rua que subia em direção à Igreja).
Nesta rua que subia para a Igreja, no seu lado esquerdo, a serralheria e o depósito de madeira ocupavam uns 50 metros de frente.
Em Coxilha tinha seis ou sete serralherias, incluindo uma bem perto no Desvio Meneghetti. Tinha muito movimento de caminhões carregados. Ainda criança, gostava de ver as belas e coloridas cabines dos grandes caminhões importados transportando toras de madeira.
Foi a devastação dos pinheirais como já vimos ao falar da criação da Colônia Nova na Vila Lângaro.
Mario Goelzer não foi um negociante brilhante. Outros madeireiros ficaram milionários ou bilionários. A triticultura e a política foram mais importantes para ele, tiraram a cabeça dele da serralheria e do negócio de madeira.
Um homem de paz
O pai era uma pessoa pacífica, sem inimigos. Não fazia represálias aos funcionários de sua serralheria que, membros ativos do PTB, faziam campanha contra a candidatura de Mario Goelzer para a Câmara de Vereadores. Era um comportamento raro para proprietários daquela época.
Nunca vi um revólver ou balas de revólver dentro de casa. Nunca vi o pai portando uma arma, nem mesmo uma espingarda para uma caçada na fazenda. Os avestruzes, que tive o prazer de ver circulando calmamente na fazenda, poderiam ficar tranquilos, Mario Goelzer não ia dar um tiro neles.
Junto com um grande homem existe uma grande mulher
A expressão se aplica muito bem ao casal Otilia e Mario. Para ter disponibilidade de tempo para a política, a triticultura e os negócios, o apoio constante de Otilia era fundamental. A presença da esposa está implícita na descrição acima de todas as atividades do marido, diariamente ouvindo, discutindo, aconselhando e suportando.
E não era tarefa fácil, com muitos filhos e com as restrições de viver numa vila sem eletricidade, sem médicos, sem padaria, sem refrigerador, fogão à lenha, onde tudo tinha que ser feito em casa.
Mãe e, da esquerda para a direita, Ernesto Fernando (Tomé), Lucidio, Ligia, Lidia (atrás) e Lucio.
Para atender essa turminha, a mãe também era cozinheira e enfermeira, mantendo a disciplina dos filhos, raramente apelando ao marido quando um filho fazia algo que merecia um “pito” do pai.
No café da manhã, o maravilhoso pão feito em casa, com uma grossa camada de schimier de abóbora. Mais tarde a gemada para reforçar o organismo e a tradicional Emulsão Scott (óleo de fígado de bacalhau; eu tapava as narinas na hora de engolir óleo).
O café da tarde sempre tinha uma delícia - sonho com centro de marmelada, pastel, massinha de pastel, arroz doce, coalhada com raspas de rapadura, mate doce em nossas cuias pequeninhas.
Nos domingos a sobremesa mais frequente era o Rei Alberto, em taças individuais para ficar mais bonito. Os pêssegos em calda e os figos em calda, feitos em casa pela mãe, eram deliciosos. A laranja amarga em calda era uma especialidade incomparável, de preferência acompanhada por um pedaço de queijo da colônia. O sagu muito bem preparado, com o creme no ponto, nada a ver com o que é muitas vezes oferecido em restaurantes. Fios de ovos, merengues, ilha flutuante com creme inglês - tudo de excelente qualidade.
Nos matos próximos íamos procurar as pinhas de pinhão; os pinhões eram assados na placa do fogão, que era mantido muito tempo aceso pois também tinha que aquecer a água para banhos, para o café, para o mate.
A mãe fazia em casa a marmelada que nunca faltava. No pátio da casa, numa área de chão batido, se colocava o grande tacho sobre pilhas de tijolos, com fogo no chão. Era o mesmo tacho usado para fazer a banha quando se carneava um porco. Uma longa pá, de quase dois metros, era usada para mexer a marmelada, protegendo a pessoa dos respingos.
Criações imbatíveis da mãe eram o queijo de porco, a morcilha e a linguiça, produtos preparados quando um suíno era carneado (para detalhes ver o relato O Dia do Duroc).
A mãe nunca reclamou, mas provavelmente devia sentir a diferença de condições de vida, comparadas com aquelas dos nove irmãos que viviam em centros urbanos como Passo Fundo, Livramento, Montevidéu e Porto Alegre, com ligações mais estreitas com os pais Lucinda e Ernesto Morsch.
Na foto abaixo por ocasião da formatura do Ginásio Conceição - Passo Fundo - Dezembro 1954:
Entrando na Igreja São José em Porto Alegre - 19 de maio de 1962 - para o casamento com Berenice:
Bodas de Ouro
Em 10/03/1975 o casal Otilia e Mário comemorou as Bodas de Ouro. A foto abaixo mostra com a família e parentes (eu estava em Genebra, no início de meu trabalho na UIT):
Na foto abaixo o pai Mario ladeado pelos rmãos Amadeu e Octaviano na mesma comemoração:
Com a Vó Lucinda
Falecimentos
Pouco mais de três meses após a comemoração das Bodas de Ouro, Mario Goelzer faleceu em 29/06/1975 como resultado de um atropelamento em Porto Alegre.
A encomendação foi com missa de corpo presente oficializada pelo Bispo Dom Cláudio Colling na Catedral de Passo Fundo. Muita gente compareceu inclusive de Coxilha e do Butiá.
Na homilia, Dom Cláudio falou longamente do pai. Lembrou quando visitou a família na casa de Coxilha, na frente da ferrovia. Disse que era uma casa grande sempre aberta aos outros pela generosidade de Otilia e Mario. Mencionou os encontros que teve com Mario em Passo Fundo. "Como sabia que eu gostava de doce de laranja, uma vez trouxe cidras colhidas na sua fazenda." Falou sobre seu papel na triticultura dizendo que o exemplo fica pois a semente do trigo não é lançada em vão na terra. (A carta que recebi de minha irmã Lidia foi bem detalhada em tudo que Dom Claudio disse, incluindo referências à mãe e aos filhos; mencionei acima só alguns pontos).
Aluisio Godoy publicou a seguinte nota em jornal:
"Há 25 anos, lá pelos idos de 1950, os técnicos gaúchos afirmavam e demonstravam que no Rio Grande do Sul não poderia haver plantação de trigo em larga escala. Diziam e argumentavam que o nosso solo não se prestava e que o clima era contrário à medida. Entretanto um homem - baixo, gordo e exuberante simpatia - não se conformava com os "técnicos" e, levado pelo espírito pioneiro e confiança inabalável, começou a dedicar-se à triticultura. Consumiu vários anos e quase sua fortuna (sua fazenda no distrito de Butiá). O resultado está ai: o Rio Grande do Sul - Celeiro do Brasil: Brasil quase autossuficiente em trigo. Dia 30 foi sepultado em Passo Fundo o corpo daquele homem simpático e teimoso. Morreu Mario Goelzer, o "pai dos triticultores", o homem que sempre acreditou no Rio Grande. Por favor, não mandem flores. Mandem trigo, para cobrir a sepultura de Mario Goelzer! (a) Aluisio Godoy,"
Otilia Morsch Goelzer faleceu em Porto Alegre no dia 15/09/1999 com quase 94 anos.
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